O impacto do rebaixamento de clubes com boa gestão financeira no futebol brasileiro
O rebaixamento de Athletico-PR, Atlético-GO, Criciúma e Cuiabá no Campeonato Brasileiro de 2024 trouxe uma reflexão profunda para o cenário esportivo nacional. Esses clubes representam exemplos de gestão financeira eficiente, com balanços equilibrados, dívidas controladas e foco em uma administração responsável. No entanto, suas quedas para a Série B destacam um problema central: a desconexão entre resultados financeiros saudáveis e o desempenho esportivo.
Enquanto a gestão responsável é fundamental para a sustentabilidade a longo prazo, o futebol, na prática, continua sendo decidido dentro de campo, onde outros fatores, como investimento em elenco, comissão técnica e infraestrutura de alto nível, têm um peso significativo. Este cenário levanta questões sobre o modelo de competitividade no Brasil e os desafios enfrentados por clubes que buscam alinhar eficiência administrativa e resultados esportivos.
A contradição: boa gestão x resultados esportivos
O sucesso administrativo de clubes como Athletico-PR e Cuiabá é reconhecido por especialistas. No entanto, a queda dessas equipes para a Série B expõe como a boa gestão financeira, isoladamente, não é garantia de permanência na elite do futebol.
Casos específicos dos rebaixados
1. Athletico-PR
- Nota AA no relatório “Convocados”, sendo um dos clubes mais bem administrados do país.
- Dívidas zeradas e histórico de superávits consecutivos.
- Estrutura moderna e competitiva, como o Estádio Joaquim Américo (Arena da Baixada).
- O rebaixamento indica que a aposta em uma gestão austera e o foco em categorias de base não foram suficientes para competir com elencos mais caros.
2. Cuiabá
- Reconhecido por sua solidez financeira, com dívidas zeradas e balanços consistentes.
- Apesar do foco em gestão eficiente, a ausência de grandes contratações e a falta de tradição em competições de alto nível podem ter influenciado o desempenho.
3. Atlético-GO
- Um dos poucos clubes com superávit anual consistente por cinco anos consecutivos.
- Apesar da estabilidade financeira, o clube enfrentou dificuldades em montar um elenco competitivo para a Série A, refletindo uma discrepância entre a gestão financeira e o investimento esportivo.
4. Criciúma
- Superávit de R$ 57 milhões em 2023 e dívidas sob controle.
- Com histórico recente de instabilidade esportiva, sua boa administração financeira não conseguiu traduzir-se em resultados dentro de campo.
Os desafios do modelo brasileiro
O rebaixamento desses clubes destaca uma realidade preocupante: no Brasil, a boa gestão financeira ainda não é suficientemente recompensada para garantir competitividade esportiva. Diferentemente de ligas como a Bundesliga, na Alemanha, onde a saúde financeira é um pilar central para a sustentabilidade do futebol, o Brasileirão ainda enfrenta os seguintes desafios:
1. Dependência de receitas variáveis
Muitos clubes dependem excessivamente de receitas pontuais, como vendas de jogadores ou premiações de torneios. Isso cria uma vulnerabilidade financeira para clubes que não conseguem garantir permanência na Série A.
2. Falta de equilíbrio na distribuição de recursos
A desigualdade na distribuição de cotas de TV e patrocínios favorece clubes maiores, dificultando a competitividade de equipes com menor apelo midiático.
3. Cultura imediatista
O foco em resultados imediatos dificulta a implementação de projetos de longo prazo. Mesmo clubes com gestão exemplar sofrem pressões para gastar mais do que podem para evitar rebaixamentos.
4. Ausência de políticas que valorizem a gestão eficiente
Não há mecanismos robustos no futebol brasileiro que premiem clubes por boas práticas administrativas, como regras de fair play financeiro mais rígidas.
A necessidade de equilíbrio: esportivo e financeiro
Embora a gestão financeira responsável seja essencial, clubes precisam encontrar maneiras de equilibrar essa abordagem com investimentos em elencos competitivos. No contexto brasileiro, algumas estratégias poderiam ser adotadas:
- Incentivos para boas práticas financeiras: Criar um sistema de bonificação para clubes com balanços saudáveis, como aumentos em cotas de TV ou isenções tributárias. Implementar regras mais rígidas de fair play financeiro para penalizar clubes que operam com déficits recorrentes.
- Fortalecimento das categorias de base: Seguir o exemplo de clubes como o Athletico-PR, mas com maior integração entre a base e o elenco principal. Ampliar os investimentos em formação de talentos para reduzir custos com contratações caras.
- Investimento estratégico em elencos: Mesmo com orçamentos menores, é possível buscar reforços que agreguem qualidade ao elenco, priorizando eficiência na contratação.
- Distribuição mais justa de receitas: Equilibrar a divisão de cotas de TV e patrocínios para reduzir as disparidades entre clubes grandes e pequenos. Isso permitiria que clubes com boa gestão tivessem mais recursos para competir esportivamente.
As lições do rebaixamento
O cenário atual deve servir como um alerta para o futebol brasileiro. A queda de clubes bem administrados financeiramente reforça a necessidade de reavaliar os modelos de gestão e competição no país. Algumas reflexões importantes incluem:
- Sustentabilidade x Competitividade: A busca por sustentabilidade financeira não pode ocorrer à custa da competitividade esportiva. Um equilíbrio entre ambas é crucial para o sucesso.
- Reconhecimento da gestão responsável: Clubes que fazem a coisa certa devem ser recompensados, não punidos. Isso inclui incentivos financeiros e maior visibilidade para suas boas práticas.
- Impacto do rebaixamento: A queda de clubes como Athletico-PR e Cuiabá, que representam exemplos de administração, é um golpe para a imagem de que o futebol brasileiro está caminhando para uma profissionalização.
Conclusão
O rebaixamento de clubes como Athletico-PR, Atlético-GO, Criciúma e Cuiabá na temporada 2024 não é apenas um reflexo das disputas dentro de campo, mas também um indicativo das limitações do modelo de futebol brasileiro. A ausência de políticas que valorizem a gestão eficiente e a falta de equilíbrio na competição reforçam a necessidade de mudanças estruturais.
O futebol brasileiro precisa aprender a premiar a responsabilidade financeira sem sacrificar a competitividade esportiva. Se nada for feito, o risco é desincentivar clubes que tentam fazer o certo, perpetuando um ciclo de dependência de gastos irresponsáveis e gestão deficiente.